DESCOBERTAS

PORTUGAL E O NOVO DESCOBRIMENTO

Perdido numa das ruazinhas de Belmonte, entro em um prédio de aparência centenária onde funciona um também velho café. Gostaria de saber onde fica o Museu Judaico da cidade.

Dado a complexidade das vielas, um velho morador sai fora e pede que eu o acompanhe. Está voltando para casa e esta, coincidentemente, fica próxima do Museu. No caminho vamos conversando.

Freqüentar cafés é quase tão religioso para os portugueses quanto ir à Fátima. E na conversa que tenho enquanto caminhamos para o Museu, percebo outra faceta lusitana: o desconhecimento das suas origens.

“O senhor vai até lá, mas não vai encontrar nada”, diz o velhinho. “Pessoas do mundo inteiro vêm até aqui, vão ao museu não sei por que. Lá não tem nada”, conclui.

É verdade. Para quem está acostumado aos grandes museus, o Museu Judaico de Belmonte, embora belíssimo, chega a ser acanhado. Mas, cada peça do seu acervo está impregnada com tanta simbologia que este se agiganta até mesmo frente ao imponente Museu dos Descobrimentos, atração maior da cidade.

A visão do gentil velhinho que me orientou é cada vez mais coisa do passado. As novas gerações estão mudando e nesta mudança estão buscando suas raízes. O auditório do Teatro Municipal da Guarda, onde se realiza o I Festival da Memória Sefardita, estava lotado de jovens que acompanhavam com atenção cada uma das falas. Dispersão apenas quando a professora, embora portuguesa, resolveu fazer sua palestra em inglês. Um ato falho da palestrante. Uma vez que os congressistas de língua estrangeira estavam com equipamentos de tradução simultânea, a platéia não versada no inglês foi pega de surpresa. Os jovens então passaram às conversas paralelas.

Assim que as palestras terminaram, os jovens novamente concentraram as atenções no palco onde, uma vez mais, os músicos Eduardo Ramos e Tiago Jônatas apresentaram Cantigas Sefarditas. Olhando para os jovens, percebia-se que eles se identificavam com a música milenar que ouviam. As Cantigas Sefarditas são acompanhadas por instrumentos completamente diferentes daqueles que embalaram uma multidão no show da banda irlandesa U2 na tournée que por aqui passou. Mas, embora anacrônico, o som que embalou os jovens da Serra da Estrela fascinou tanto quanto o do U2 encantou os jovens de Coimbra.

Portugal está fazendo uma nova descoberta: Está descobrindo suas raízes. Num dos vídeos apresentados no festival, um senhor diz que 70% dos portugueses têm sangue judeu. Andando pelo país chegamos quase que a acreditar nisso. É comum ouvirmos pessoas, mesmo crianças, trocando o V pelo B numa clara interferência da forma como os judeus usam Beit ou Veit. Kfar pode ser Saba ou Sava. Tel pode ser Aviv ou Abib. Aqui não é diferente.

No interior não é difícil encontrar aldeias com nomes ligeiramente alterados como Cadima e Lemede ou referências diretas como o Vale dos Judeus. Na verdade, Israel lateja no mapa português.

E as autoridades portuguesas estão atentas à esta descoberta pós moderna. Se no passado os navegantes singravam os mares em busca de novas oportunidades comerciais, os mares a serem navegados hoje são outros. Com a economia estagnada, caminhando para a recessão, o Turismo pode ser a nova Rota dos Descobrimentos Portugueses.

Na abertura dos trabalhos no I Festival Internacional da memória Sefardita, Jorge Patrão, Presidente do Turismo na Serra da Estrela, destacou a importância de se dar um destaque maior à Rota das Antigas Judiarias, como forma de alavancar o turismo local.

No pequeno – e belo – espaço da Serra da Estrela encontram-se cidades de importância história imensurável para os judeus. Além das emblemáticas Belmonte, Guarda e Trancoso; as freguesias vizinhas formam um cinturão de atrações inesgotáveis. Méda, Figueira, Pinhel, Almeida, Celorico da Beira, Fornos de Algodres, Gouveia, Seia, Manteigas, Sabugal Covilhã e Penamacor começam a ser descobertas pelos portugueses como oportunidades turísticas a serem exploradas.

O número de autoridades presentes na abertura dos trabalhos mostra o quanto a proposta de desenvolver um turismo de matiz judaica é levado a sério. Além do Consul de Israel em Portugal, Ehud Gomer, os trabalhos contaram com a presença do Secretário de Estado da Cultura, do já citado Presidente do Turismo da Serra da Estrela e dos Presidentes das Câmaras Municipais de Guarda, Belmonte e Trancoso entre outros.

Estudos publicados no Americam Journal of Human Genetics (AJHG) dão conta que 30% dos portugueses são de ascendência sefardita. 23,6% na região Norte, onde acontece o Festival, e 36,3% ao Sul, para onde se dirigirão os congressistas nos dois últimos dias do evento.

O estudo publicado no AJHG diz que por cinco séculos os portugueses preservaram “o sangue judaico”. Ou seja, podemos afirmar cientificamente que os judeus descobriram Portugal.

Hoje, olhando para a platéia do I Festival Internacional da Memória Sefardita, constatamos que eles agora estão descobrindo os Judeus.

JUDEUS ASSISTEM A ABERTURA DO CONGRESSO

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